domingo, 3 de abril de 2016

Release Borda

Isto quem me deu foi João Guimarães Rosa. “Um filho deixado sem pai é um filho deixado à borda. Só lhe resta a borda, espaço entre o tudo e o nada do rio. É nela que ele constrói sua existência, repleta de tudos e de nadas.”
  
Engendrado entre 2007 e 2012 publicado em 2014 pela Editora Patuá, BORDA nasceu em um caderno azul de capa dura durante uma internação psiquiátrica. Catarse em forma de poesia, dança à beira do abismo que naquele momento era eu mesma.  Palavras que se prestaram como costura do oco da carne implantada pelas dores e perdas da vida. Tecendo a memória e a carne do mundo observado fui fechado brechas, suturando feridas abertas.
Já a temática "fotografia", presente em BORDA, escrito em um momento de incômodo com o envelhecimento, reflete um tanto desse mal-estar, desconforto e estranhamento diante do objeto fotografia enquanto elemento de sustentação da memória.
Em BORDA ainda é possível ouvir como a turbulência do "eu mulher" ressoa em mim. Não estou no mundo como mulher impunemente. Desde a infância a rejeição ao lugar de "menos que os homens", ao qual eu nasci destinada, instalou em mim uma guerra na busca da autoafirmação. Sua poesia evidencia que uma outra experiência com o feminino é possível. A mulher livre, forte, desamarrada das convenções sociais. Também não aceita categorizações (poesia de mulher, de negro de gay, de índio, de pobre etc.).
Então BORDA é isso, margem do abismo, costura, memória e exercício do feminino desatado. Dentre outras coisas.


bebo da borda de tudo
margem mirando
o fundo do furo

Norma de Souza Lopes


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